A personagem de ficção: como criar um protagonista que cativa e intriga

Antes de começarmos a escrever um romance, é crucial entender alguns conceitos fundamentais sobre a personagem de ficção. A palavra “personagem” vem do latim “persona”, que significa máscara de ator de teatro. Em outras palavras, personagens são os seres fictícios que impulsionam a história.

Cândida Vilares Gancho define o personagem como “[…] um ser fictício responsável pelo desempenho do enredo; em outras palavras, é quem faz a ação”. Isso significa que são eles que movem a história para frente.

Scarlett O’hara, interpretada por Vivien Leigh; do romance E o vento levou da escritora Margaret Mitchel. (Foto retirada do Google imagens)

O romance se constitui de três elementos: enredo, personagens e ideias; mas é a personagem que possibilita a adesão afetiva e intelectual do leitor, Antonio Candido em A personagem de ficção afirma que a personagem o elemento mais vivo no romance. Por isso, Gosto de dizer que o coração de qualquer livro são os personagens, porque são eles que dão vida à história. Sem personagens bem desenvolvidos e cativantes, mesmo o enredo mais complexo pode se tornar monótono e desinteressante. Em resumo, são os personagens que tornam a narrativa, em muitos casos, memorável, estabelecendo uma conexão profunda com o leitor.

Personagens memoráveis são difíceis de esquecer, não tem como falar de Dom casmurro e não lembrar de Capitu ou ler E o vento levou e nunca esquecer Scarlett O’hara.

Candido também salienta que  uma personagem é a realização de um ser fictício. Enquanto na vida real a natureza do ser humano é fragmentada e cheia de contradições, no romance o autor tem a liberdade de criar uma personagem com uma lógica interna que oferece ao leitor uma sensação de completude e coerência. Assim, mesmo que a personagem seja mais lógica do que um ser humano real, isso não significa que ela seja mais simples. Na verdade, personagens complexas são uma característica importante do romance moderno.

Atualmente, muitas histórias literárias se concentram em explorar a psicologia das personagens para torná-las mais reais e complexas. Diferente das descrições detalhadas do exterior das personagens usadas no passado, o romance moderno se foca em como é a mente e a vida interior das personagens. Essa abordagem é resultado de séculos de desenvolvimento na forma de criar personagens, e, devido à complexidade desse processo, é difícil definir uma forma final de fazer isso.

As mudanças na maneira como as personagens são criadas refletem a sociedade e o tempo em que os autores e leitores vivem. Isso significa que a forma como os autores usam a linguagem e constroem suas personagens é influenciada pelo contexto social e cultural da época.

Capitu interpretada por Maria Fernanda Cândido; livro Dom Casmuro escrito por Machado de Assis (Imagem retirada do Google imagens).

Desde as antigas epopeias até os romances modernos, as técnicas para criar personagens evoluíram muito, adaptando-se e muitas vezes contrastando com o contexto social, cultural e político de cada período. Na era clássica, por exemplo, as personagens eram heróis que representavam a força e os ideais de suas sociedades.

O conceito de personagem como um ser com uma psicologia interna começou com o surgimento do romance. Hoje, as personagens são moldadas pelas mudanças sociais e culturais, refletindo novas formas de ver o ser humano.

Adorno fala sobre a perda de algo especial na experiência da vida, que antes estava presente nos heróis das epopeias. No romance moderno, a capacidade de falar e expressar ideias próprias torna a personagem diferente dos heróis clássicos. Segundo Bakhtin, essa habilidade de ter uma voz própria é o que dá originalidade ao romance.

No entanto, simplesmente falar não é suficiente para criar um personagem completo. Muitas personagens anteriores ao romance moderno, apesar de terem características próprias, acabaram se tornando figuras superficiais ou estereotipadas, sem o desenvolvimento profundo que caracteriza as personagens mais complexas de hoje.

Em seu livro Aspectos do Romance, publicado em 1974, Edward Morgan Forster explicou que personagens planas são simples e construídas em torno de uma única característica, tornando-as previsíveis e pouco surpreendentes. No século XVII, essas personagens eram chamadas de “humorous”, ou às vezes “tipos” ou “caricaturas”. Elas são basicamente unidimensionais.

Por outro lado, as personagens redondas são mais complexas e ricas em detalhes. Elas têm características que as tornam imprevisíveis e capazes de surpreender o leitor. Forster afirmou que uma personagem é considerada redonda se ela consegue surpreender de maneira convincente. Se a personagem nunca surpreende ou se tenta parecer complexa sem realmente ser, ela é considerada plana.

Personagens redondas têm a “incalculabilidade da vida”, o que significa que, assim como pessoas reais, elas têm profundidade e complexidade. O autor usa essas personagens para criar uma história mais rica e interessante, harmonizando-as com outros aspectos da obra. Personagens contemporâneas são projetadas para viver experiências humanas profundas, independentemente de quão detalhada ou complexa seja sua construção.

  1. Estabeleça as motivações e objetivos de um personagem . Pense na busca de Harry Potter para derrotar Lord Voldemort, alimentada pelos assassinatos de seus pais. Grandes personagens são movidos por uma motivação profunda e têm um objetivo que estão tentando alcançar. Isso cria personagens interessantes e também cria um arco de história. A força motriz do personagem principal deve ser um dos primeiros elementos da história que você descobre, já que a ação subsequente será movida por essa motivação.
  2. Escolha uma voz . Quem vai contar a história? O ponto de vista em primeira pessoa permite que um personagem, geralmente o personagem principal, narre a história usando os pronomes “eu” e “mim”. O ponto de vista em terceira pessoa é uma voz que está fora da ação. A perspectiva do narrador determinará como as informações de um personagem são reveladas ao longo da história.
  3. Faça uma revelação lenta . Evite revelar muito na primeira vez que você apresentar um personagem. Revele informações aos poucos conforme você conta a história — não muito diferente da maneira como as pessoas se conhecem na vida real.
  4. Crie conflito . Conflito é um recurso literário que coloca forças opostas umas contra as outras, geralmente envolvendo o personagem principal. Existem diferentes tipos de conflitos que impactarão as decisões do seu personagem. Por exemplo, se você tem personagens fortes, teste a determinação deles colocando-os contra algo que revele suas fraquezas. Um conflito pode ser externo — crie um cara mau para enfrentar um personagem bom. Um personagem também pode ter uma luta interna quando tem que agir contra sua moral ou lidar com crenças opostas. O conflito cria tensão e é usado para fazer uma história avançar, forçando os personagens a tomarem decisões.
  5. Dê aos personagens importantes uma história de fundo . Todos nós temos uma história de fundo, e seus personagens fictícios também precisam de uma. Investigue a vida dos seus personagens e desenvolva suas histórias. Mesmo que a maior parte dela não vá para a página, a história de fundo de um personagem ajudará você a descobrir o que os faz funcionar e informará suas decisões na história.
  6. Descreva a personalidade de um personagem em termos familiares . Para criar personagens críveis, crie uma personalidade para seus personagens principais e secundários com base em características de pessoas reais — isso ajudará você a criar um personagem multidimensional e redondo com traços de personalidade e peculiaridades reconhecíveis.
  7. Pinte um retrato físico de seus personagens . Descreva a aparência física de seu personagem: cor do cabelo, olhos, estatura. Quais são seus maneirismos? Como é sua linguagem corporal? Descreva-os para ajudar os leitores a visualizar uma imagem mais realista de seu personagem.

8. Adicione características específicas

Depois de definir um arquétipo inicial, você pode começar a moldar o personagem e torná-lo original. Considere a conexão emocional entre seu público e seu personagem e trabalhe em direção ao resultado desejado. Você pode descobrir que mudar a idade e o gênero de um personagem pode levar a respostas muito diferentes do seu leitor. Aqui estão alguns outros exemplos que você pode usar para criar um personagem único:

  1. Aventureiro e aventureiro
  2. Distraído e frequentemente perdido em pensamentos
  3. Compassivo e empático
  4. Obcecado em resolver palavras cruzadas ou enigmas
  5. Inteligente e analítico
  6. Espirituoso e sarcástico
  7. Ambicioso e motivado
  8. Introvertido e introspectivo
  9. Carismático e charmoso
  10. Meticuloso e detalhista

9. Desenvolva personagens secundários . Crie diferentes tipos de personagens que contrastem entre si. Um ajudante (pense em Watson para Sherlock Holmes) ou um contraste (Draco Malfoy nos livros de Harry Potter ) pode iluminar os traços, pontos fortes ou falhas do personagem principal. Se você criar um personagem estático — um arco de personagem plano que não evolui muito — contraste-o com um personagem dinâmico, um que passa por uma metamorfose ao longo da história.

10. Dê um arco ao seu personagem

Um personagem crível cresce e muda conforme sua história evolui. Assim como pessoas reais, eles se adaptam e respondem aos eventos da vida. Considere onde seu personagem começa e como ele muda junto com os desenvolvimentos da história. Como ele supera seus obstáculos iniciais? Por exemplo, ele aprende novas habilidades, ganha uma nova perspectiva ou faz novos relacionamentos que levam ao sucesso?

Espero que estas orientações tenham sido úteis para auxiliá-lo na criação de um protagonista  bem desenvolvido. Desejo-lhe sucesso em sua jornada de escrita e que seus personagens evoluam de maneira a enriquecer a experiência do leitor. Agradeço por acompanhar estas sugestões e espero vê-lo em futuras oportunidades. Até breve.

 

 

 

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